12.12.12

PARTE 1 - Como Nossa História Tornou-se Apenas Um Livro


PARTE 1 –  DE COMO NOSSA HISTORIA ESCAPOU POR ENTRE OS DEDOS


Faz seis meses desde então, e já nem me lembro mais como era me sentir feliz. É como se tudo isso tivesse sido há muito tempo. Como se tivesse existido dentro de um sonho bom, que foi interrompido bruscamente pelo som de um despertador qualquer.

Às vezes era assim que parecia.

Pela janela de cortinas cerradas do meu quarto, os dias passavam lentos, e a internet tornara-se minha companheira fiel: Passava dias inteiros fazendo downloads de filmes pra mascarar toda minha dor e solidão. O que parecia ser ironia do destino, já que fora a internet o instrumento que me levara a ter, o que julgara ser, a experiência mais sublime da minha vida. 
Mas hoje isso também parece ter sido há muito tempo...

As recordações me assombram como velhos fantasmas conhecidos: Já não sinto medo delas. Vez por outra, me agarro a elas como única chance de não abandonar o que inevitavelmente se tornou passado.

E assim, também inevitavelmente, as coisas seguem sua ordem. E não estava sendo diferente comigo: quando dei por mim, minha vida havia seguido um rumo não planejado, e contra a minha vontade, eu estava aprendendo a dançar conforme essa nova música.

O barulho da chuva lá fora dita o ritmo da preguiça. O final de semana se espreme por entre o tiquetaquear do relógio. A noite passada me fez relembrar sensações das quais estava me forçando apagar das entranhas de minha memória. Talvez se não fosse aquela música...

Chovia noite passada: forte e impiedosamente. O pára-brisa do meu carro - um pequeno Ford Ka® - tentava em vão melhorar a visibilidade da estrada. As gotas de chuva faziam sombra em meu rosto quando, por ventura, cruzava com algum poste de iluminação. Podia ver as sombras correrem pelo meu rosto pelo espelho retrovisor.

 A estrada estava completamente vazia. Tão vazia quanto minha bolsa, meu estomago e meu coração. O carro, porem estava cheio de um silêncio enlouquecedor e sufocante. Liguei o rádio no intuito desesperado de me sentir em companhia de algo. Após o silêncio ser quebrado pelo som da estática de algumas estações de rádio, ouve-se os acordes de uma música tão baixa que mau se conseguia ouvir. Mudei novamente de estação e o carro foi invadido por uma voz inconfundível. As batidas da bateria no compasso da música pareciam camuflar meu coração descompassado. 

A música era conhecida. A letra havia decorado há muito. Porém meus lábios silenciaram.
Meus olhos viam, porem não enxergavam a estrada. Era como se eu estivesse sob o comando de um piloto automático.
Aquela música havia tomado conta de meu ser, fazendo-me rever um filme já conhecido e tantas vezes repassado.
Quando dei por mim. Estava em frente à garagem de casa, com chuva amena no pára-brisa e lágrimas nos olhos.

Ainda sob o comando do piloto automático, enfio a chave na tranca da porta. 
Trancada. 
Chave errada. 
Mais uma vez, e depois de dois giros a porta se abre. Joguei a bolsa no sofá. Despejei as chaves no aparador próximo da porta. Ainda na sala, tirei as roupas molhadas, fazendo uma trilha com elas até o banheiro.

Durante o banho, tentei me refazer do acontecido. A água quente que saia do chuveiro, enchendo o banheiro de vapor, não era suficiente pra conter meu corpo trêmulo. Minhas mãos ainda estavam geladas, e meu coração apertado. Quanta coincidência em tão pouco tempo!

Do espelho embaçado podia ver um eu que não conhecia: mais velha, madura, mais dura, e com menos tempo pras coisas que realmente me faziam feliz. Um eu que aprendera a viver enxergando em branco e preto. Minha vida havia perdido a cor.

Visto um pijama qualquer e, sem animo para secar os cabelos, deito pesadamente, me afundando no travesseiro, desejando me fundir com a cama.

Tentei dormir, mas foi em vão. Os pensamentos avançavam como ondas sobre a praia. Sentei na cama, apoiando-me em uma pilha de travesseiros. O quarto estava quase totalmente tomado pelo breu, se não fosse a luz artificial emanada de meu notebook a tiracolo.

Fechei os olhos por um pequeno instante que me pareceu eterno. Respirei profundamente enchendo meus pulmões ao máximo, soltando o ar lentamente até ficar totalmente vazio. Repeti isso mais algumas vezes, deixando-me ser invadida por uma avalanche de lembranças, emoções, lágrimas e a decisão de enterrar tudo isso de uma vez.

Há seis meses eu estava elaborando este maldito luto. Estava na hora de finalmente preparar-me para o enterro. Assim, talvez, se tornaria mais fácil seguir a vida sem precisar reviver dia após dias, em minha mente, todas essas lembranças que me faziam sentir pena de mim.

Estava pronta pra escrever um livro, e enterrar de vez essa história.

2 comentários:

sergio disse...

Começou!! Ansioso *-*

Livretando disse...

A história é bem escrita e bem conduzida. Tem ritmo e prende.